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Universidade Federal de Alagoas - UFAL
 

18/12/2010
Comportamento
A VIDA COMO ELA ERA

O dia-a-dia dos que trabalham em profissões “raras” e que aos poucos desaparecem do mercado, como o ascensorista, o amolador de facas e o alfaiate

Por Marcos Leonardo

Prédio da Previdência Social no Centro de Maceió. O relógio marca 11h39. O lugar parece um formigueiro humano, gente de toda a cidade (e até de outras!) dispostas, ou nem tanto, a resolver seus problemas previdenciários. Barulho, muito barulho, um coro de diversas vozes desafinadas e desencontradas. Em meio a elas destaca-se uma voz que vem do elevador e diz “Sobe?”. Esta é a fala do jovem Maurício Valério, 25 anos.

Aparentemente é até um contra-senso imaginar que ainda exista um ascensorista hoje em dia. A profissão nasceu quando os elevadores surgiram, mas o profissional foi se tornando desnecessário (Para que alguém dentro do elevador? Para apertar um botão? Pode estar se perguntando o leitor mais indelicado). A verdade é que a profissão foi realmente abolida nos dias atuais, e os poucos trabalhadores daquela cadeirinha do elevador usam a profissão apenas como emprego temporário enquanto não encontram outro serviço. “Eu quero abrir caminhos, quero algo melhor. Ao total somos doze ascensoristas na previdência e a maioria faz faculdade ou trabalha com outra coisa”, afirma Maurício ao revelar que, depois de 3 anos, deixará a profissão para se dedicar a um empreendimento comercial dos pais.

Ainda que tenha usado a quase extinta profissão como “trampolim”, Maurício diz gostar do emprego pois nele conseguiu fazer amizades que ultrapassaram as paredes do elevador e duram até hoje. “Eu fiz amizades no elevador com pessoas da instituição que mesmo essas pessoas saindo a amizade continuou”, diz Maurício. Perguntado se a profissão oferece risco, a resposta está na ponta da língua do jovem ascensorista “Sim! Já fiquei 15 minutos preso no elevador e senti muito calor. Tive medo do elevador cair. Ainda bem que estava só!”.

Se o medo faz parte do cotidiano de Maurício, a palavra sequer faz parte do vocabulário de um pequeno ponto comercial também no Centro de Maceió onde encontramos Seu Adail, amolador de faca. “Nunca me machuquei seriamente”, conta orgulhoso, no auge de seus 32 anos de profissão. No entanto, Seu Adail revela que hoje não dá para ser apenas amolador, em geral os profissionais da área também são chaveiros. Engana-se quem pensa que o amolador está acabando no mercado. “Quando eu comecei eram uns 10, hoje são cerca de 200”. O profissional “híbrido”, amolador-chaveiro, está cada vez mais requisitado. “São muitos trabalhos por dia”, afirma Adail sem saber precisar seu volume de vendas. O profissional confessa que na adolescência sonhava em fazer administração, mas por falta de recursos começou a trabalhar como amolador, posteriormente chaveiro e hoje se sustenta com o suor da profissão. E diz que, de certa forma, conseguiu realizar o sonho de ser administrador. Ele mesmo cuida dos dois pontos comerciais que possui: um no Centro e outro na Jatiúca. Orgulhoso, Seu Adail conta que aprendeu a trabalhar como amolador na labuta diária e, depois de quase desistir da profissão, revela ter formado muitos concorrentes. “Ensinei a várias pessoas o meu trabalho e alguns estão no mercado”, revela.

JÁ VESTIU FAMOSOS – Formar concorrentes está longe de ser uma exclusividade de Seu Adail. E quem pode afirmar isso é Divaldo Luís da Silva, alfaiate há, também, 32 anos. Divaldo aprendeu técnicas de costura com uma tia e um irmão ainda na adolescência e não parou mais. Formou novos alfaiates, como seus irmãos Djavan e Oceano, mas ainda se mantém como principal nome da área em Alagoas.

Figura extrovertida de sorriso fácil, logo muda o semblante quando é convidado a fazer um panorama sobre o mercado de alfaiataria no Estado. “É uma profissão rara, está acabando. Não há investimento do Governo para o nosso crescimento profissional. Se tivéssemos mais apoio prestaríamos grandes serviços”, desabafa Divaldo, que afirma não largar a profissão por gostar do que faz. O alfaiate confessa ter estudado propostas para sair de Alagoas, mas a vontade de mudar a cara do mercado alagoano o impediu todas às vezes. Essa vontade já o conduziu, inclusive, para a vida política “Já participei de três eleições. A intenção é melhorar a vida da categoria e investir em cursos gratuitos”, revela Divaldo. O profissional se mostra indignado com a falta de apoio e reconhecimento do Governo e culpa o Estado por não ter concorrentes e mão-de-obra especializada.

Ao mudar de assunto o experiente alfaiate muda também sua expressão. Fala com orgulho dos clientes que já atendeu: Renan Calheiros, João Lyra, Tereza Collor e até Pedro Henrique Cardozo, filho do ex-presidente FHC. Curiosamente, em meio a tantos famosos, Divaldo faz questão de lembrar de um em especial. “Você conhecia Zinaldo? Era o segundo homem mais gordo do mundo, pesava 330 Kg. Eu que fazia as roupas dele. Essa é nossa diferença, o mercado não vê o cliente, nós vemos”, finaliza Divaldo.

Não haver reconhecimento profissional por parte do Governo, da sociedade ou de quem quer que seja, enfraquece qualquer área de atuação. E isto é que certamente fez Maurício deixar a profissão de ascensorista, Seu Adail pensar em desistir de ser amolador e Divaldo se indignar com os rumos da alfaiataria. Porém, sonhar com dias melhores se apresentou como uma constante na vida não só dos três, mas de todos os profissionais e, em especial daqueles que trabalham em áreas que aos poucos morrem.

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