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Universidade Federal de Alagoas - UFAL
 

21/10/2008
Medicina
O RISO NA CURA DE DOENÇAS

O Sorriso de Plantão, projeto de iniciativa de estudantes da Ufal, leva alegria e descontração às crianças enfermas no Hospital Universitário

Por Estêvão dos Anjos

Os hospitais têm por característica ser um local silencioso, sombrio e triste. No caso do Hospital Universitário Professor Alberto Antunes da Ufal, estas características são realçadas pelas partes deterioradas das paredes, deixando à mostra tubos de encanamento e teias de aranha, revelando descaso. Porém, contrastando com as características que tornam o ambiente um cenário de um filme de Tim Burton ou de um conto de Edgar Alan Poe, aos sábados um grupo de estudantes de vários cursos da Ufal e de outras faculdades de Maceió veste-se de palhaços doutores e rumam ao 3° andar, onde funciona o setor de pediatria, para levar um pouco de alegria às crianças. Estes estudantes fazem parte do Projeto Sorriso de Plantão.

Existente há seis anos o projeto teve início quando uma aluna do curso de medicina tomou conhecimento de um trabalho realizado em São Paulo e no Rio de Janeiro por um grupo palhaços profissionais que desenvolviam a sorrisoterapia. “Como a estudante trabalhava no hospital ela trouxe o projeto para o HU. Ela com outras pessoas do curso de medicina se vestiam de palhaço e brincavam com as crianças. Aí elas notaram uma melhoria tanto na patologia quanto na aceitação ao tratamento e aos profissionais que trabalham com as crianças”, explica Maria Rosa ou Doutora Florzinha, enfermeira e coordenadora do projeto.

Na primeira formação, apenas estudantes do curso de saúde faziam parte do projeto, mas, após algum tempo, o grupo chegou a um acordo de que para ser solidário o estudante não tem que ser um médico ou enfermeiro. “Antes de tudo, o projeto Sorriso de Plantão é um trabalho solidário e a solidariedade é um sentimento humano”, explica Florzinha. “Mas seria interessante que profissionais da área de saúde participassem para haver no profissional um processo de humanização”, conclui.

Dentre os estudantes o projeto tem pessoas da área de direito, comunicação, enfermagem, terapia ocupacional e medicina. Os motivos para o ingresso no projeto são variados, mas todos eles fundamentam-se naquele espírito de solidariedade mencionado pela Doutora Florzinha.

Parece que este foi o grande motivo para Priscila Maris ou Doutora Piculita, estudante de Farmácia da Ufal e que entrou no projeto na última seleção ocorrida em março deste ano. “Como sempre lidei com crianças, eu tenho irmãos menores que eu, e por sempre ter tido vontade de participar de um trabalho solidário, resolvi me inscrever no projeto”, explica. Doutora Piculita ainda fala do retorno humano que a participação no projeto está lhe conferindo. “Eu tinha uma pequena noção do que seria isso para mim, de quanto me envolveria, mas nunca pensei que fosse tanto, você só tem uma noção exata quando realmente está participando, é muito gratificante para mim”, comenta.

Já a estudante de enfermagem da Uncisal Ana Carla de Oliveira, a Doutora Solzinha, o acesso ao grupo foi diferente. “Tomei conhecimento através da Flávia que é uma das coordenadoras do projeto e minha amiga. Aí quando entrei na universidade resolvi fazer o teste e agora estou aqui”, conta.

O espírito de solidariedade vai mais além do que o retorno humano que a participação lhe confere. Doutora Florzinha, que horas atrás havia recebido alta médica, fala que quando não vem aos sábados para o hospital sua semana não foi completa, falta algo. “Eu me divirto, é até meio egoísta de minha parte, porque eu fico mais feliz do que muita criança”, confessa.

Tristeza é uma doença – As atividades desenvolvidas pelos palhaços com as crianças vão de acordo com as limitações de cada paciente. Antes de cada visita é passada aos palhaços a relação de pacientes, as idades e a enfermidade de cada uma para que as brincadeiras não ultrapassem as limitações físicas deles. “Às vezes tem criança com problemas cardíacos, aí nós evitamos brincar de dar susto; se uma criança necessita de repouso nós evitaremos correr com ela nos corredores. As nossas brincadeiras são de acordo com as crianças”.

O grupo encara a tristeza como uma doença. “Apesar de não se falar muito, a tristeza é uma doença, ela baixa a imunidade e deixa a pessoa suscetível às patologias”, explica Florzinha que desenvolveu seu trabalho de conclusão de curso analisando como o sorriso atua no processo de recuperação de enfermidades baseando-se em sua participação no Sorriso de Plantão e em depoimentos dos doutores palhaços.

Antes do surgimento dos circos, os palhaços existiam como uma forma de entretenimento para as pessoas e com a proposta de curá-las através do riso. Futuramente o palhaço passou a ter seu espaço de atuação, o circo, mas isso não descartou a possibilidade de atuar em outras localidades como, por exemplo, os hospitais. A primeira oportunidade surgiu com o palhaço Michael Christense que foi convidado a fazer apresentações às crianças internadas no setor de cardiologia do Columbia Presbyterian Babies Hospital, no ano de 1986.

Para Florzinha, o método de trabalho dos palhaços vem a ser uma quebra de paradigma se comparado ao trabalho do médico tradicional. Com esses cinco anos de experiência ela afirma que hoje não consegue ver as crianças e seu problema isoladamente, ela vê um todo, um ser humano antes mesmo de ver o grau de enfermidade dela. “Este trabalho torna a gente mais sensível, ele contribui muito para quebrar a frieza existente nos hospitais”.

Como uma forma de quebrar o clima pesado do hospital, os palhaços realizam uma espécie de ready-made com os objetos dos quartos: o suporte do soro passa a ser um porta-calcinha, as agulhas são formigas e os leitos viram um trem. “Em uma dessas brincadeiras um paciente de cadeira de rodas queria apostar corrida com as outras crianças, então passamos a questionar por que ele não usava o carro que ele estava usando (a cadeira). Uma mãe vendo que o seu filho estava em desvantagem reclamou, então resolvemos fazer a corrida de cadeira de rodas, que é o maior sucesso”, conta Florzinha.

Além disso, o sorriso possui funcionalidade terapêutica. Em seu Trabalho de Conclusão de Curso, Doutora Florzinha descreve a importância do sorriso para os pacientes: “... o riso é como expressão de alegria, na qual melhora os sistemas cardiovasculares, respiratório, imunológico, muscular, nervoso central e endócrino entre outros. ‘Ele é utilizado para combater sérias doenças que ocasionam dores crônicas e somatizações no tratamento de pacientes de todos os tipos de hospitais’”.

O sorriso e seus significados – Para se ter uma noção de como o trabalho reflete na criança, foi desenvolvido um estudo que analisava os tipos de sorriso e sua respectiva comunicação, porque além de ser uma forma de expressar alegrias, o ato de sorrir pode ter outros significados, desde a sedução até exercer dominação sobre o outro. No sorriso infantil foram detectadas três categorias de sorriso: o com a boca aberta mostrando a língua que corresponde a brincadeira; o sorriso que mostra os dentes inferiores e superior que comunica satisfação e prazer; e o sorriso com a boca fechada que é sinal de cordialidade e moderada satisfação.

Porém, a metodologia ainda sofre muito preconceito; constantemente os Doutores Palhaços escutam queixas dos médicos que acusam eles de fazer barulho nos corredores, em alguns casos o grupo já chegou a ser impedido de entrar no hospital e realizar as atividades. “Mas não nos deixamos atingir por isso, porque sabemos que nosso trabalho é tão importante quanto o deles”, rebate as críticas Doutora Florzinha.

Para a médica residente do setor de pediatria, Ana Márcia, o trabalho tem a sua importância. “O trabalho deles é muito importante para as crianças, elas ficam aqui esperando chegar os sábados para brincar com eles. O dia-a-dia daqui é muito estressante, com exames... Então o sábado se torna uma folia e isso é importante”, explica.

Sônia Maria da Silva, mãe de uma paciente internada há três meses no setor, também julga importantes estas atividades com as crianças. Ela comenta que, apesar do tamanho da filha, ela percebe mudança no comportamento dela com a chegada dos palhaços. “Ela fica toda animadinha”, complementa.

Tendo consciência que o hospital é um local onde se encontram pacientes com tipos e graus variados de enfermidades, existe uma preparação para que os palhaços saibam agir em momentos mais fortes, como em caso de perdas de pacientes.

A estudante Mayanna Amorim do curso de Relações Públicas, que representa a Doutora Jujuba, conta um caso que comoveu todos os palhaços presentes, o caso do garoto Carlinhos. “A gente o acompanhava há muito tempo. Ele estava em um estado muito ruim, sofrendo de um problema renal. Aí passei a vir durante quatro semanas seguidas acompanhando-o. Em uma oportunidade em que estive brincando com ele, levamos as comidas que ele queria, mas que o quadro médico dele não permitia que comesse. Então o médico liberou porque já estava na fase terminal. Sabendo da situação de Carlinhos, o grupo tratou de dar o melhor que podia a ele: dançamos, jogamos, brincamos... Todos os médicos e estudantes vieram visitá-lo, trouxeram presentes... Então ele notou algo de estranho naquilo e aproveitando um momento de distração dos outros palhaços perguntou a mim: ‘Eu estou morrendo?’ Foi a pior coisa que poderia ouvir, todos pararam na hora e não sabiam o que falar. Aí rapidamente disfarçamos, perguntando se ele estava doido, dizendo que se ele estava ali falando como é que ele podia estar morrendo. Essa foi minha pior experiência”.

Atualmente o grupo mantém-se com as colaborações dos estudantes que participam, mas nem sempre foi assim. No ano passado o grupo recebia uma bolsa e para o ano que vem pretendem novamente se inscrever como projeto de extensão.

Para os estudantes interessados pelo projeto, a seleção é anual. O calendário para as inscrições e entrevistas pode ser conferido no blog do projeto, cujo endereço é www.sorrisodeplantao.blogger.com.br. Enquanto isso sorrisos são postos em rostos, fazendo que momentos de angústia e medo tenham situações de alegrias. “Mesmo que uma criança não responda a estímulo nenhum, nós sabemos que a audição é o último sentido que uma pessoa perde, então cantaremos para ela. Nossa missão é oferecer momentos de conforto e, se necessário, fazermos com que o último dia de vida delas seja o mais feliz possível. É para isso que estamos aqui”, finaliza Doutora Florzinha.

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